No coração do Litoral Norte gaúcho, um dos eventos religiosos mais tradicionais da Diocese de Osório chega a uma marca histórica: os 75 anos do Santuário Diocesano da Gruta de Nossa Senhora de Lourdes.
A celebração ganha ainda mais significado com a realização da 46ª Romaria, no dia 25 de maio de 2025, quando milhares de devotos devem percorrer os caminhos da região rumo à Gruta, em um testemunho vivo da devoção que moldou a identidade religiosa e comunitária de Dom Pedro de Alcântara e região.
O tempo parece pouco diante da intensidade das memórias daqueles que acompanharam a origem do Santuário e viram nascer a Romaria anual. Para seu Olavo Paulo, de 85 anos, e dona Helena Paulo, de 87, a história da gruta começa com um gesto quase de improviso e fé.
“Para descobrir a gruta, se tinham ou não tinham condições, eles emendaram ripa, uma ripa na outra… iam pregando degrau por degrau para subir lá em cima pela escada”, recorda Olavo.
Foi assim que a comunidade, ao lado do pároco da época, Pe. Luiz José Benini, conseguiu levar a imagem da santa para o alto da gruta, em 1950. “A Santa foi subida por roldanas em três pedaços”, conta ele, lembrando do calor intenso do dia 11 de fevereiro daquele ano, quando a inauguração reuniu figuras do governo municipal e estadual, o bispo de Caxias do Sul, dom José Barea, e um grande número de fiéis.
As primeiras celebrações foram simples, com doces feitos em casa e vendidos em mesas improvisadas. “Era tudo meio a bala, como a gente diz”, ri Helena, relembrando também o episódio que um paraquedista saltou de um avião de pequeno porte sobre a mata, numa tentativa inusitada de abrilhantar o evento. O cenário era humilde, mas o espírito era grande – e cresceu com o tempo. “Chegou ao ponto que chegou”, resume ele Olavo.
Entre os que mantêm viva essa tradição também está o Manuel Selau e Maria Medianeira, que há mais de uma década dedicam-se intensamente à Romaria. Desde que se mudaram para a localidade de São Brás, nunca deixaram de participar. “Eu me lembro que a gente não falhou nenhuma”, conta Manuel. Com o tempo, ajudaram a erguer estruturas como a cozinha comunitária e, mesmo com problemas de saúde, continuaram servindo com alegria. “Eu estava no hospital, com muita dor… pedi à Nossa Senhora que me ajudasse a resistir. E meu neto participou da Romaria vestido de anjo”, conta Maria.
A fé, para eles, se manifesta em forma de ação, sacrifício e serviço. Em cada romaria, Maria convida todos a se unirem nesse espírito. “Nossa Senhora de Lourdes é uma santa que faz muitos milagres. Quem tem fé precisa fazer um sacrifício e chegar até aqui.”
Mais do que uma tradição, a romaria é um modo de vida para dona Teresa, que, com mais de 90 anos, segue firme a cada nova edição. “Quando começou, a gente não sabia que ia dar tanta gente. Chegamos lá e começou a vir gente, gente… Não sabíamos o que fazer!”, diz ela, rememorando os tempos em que pastel, café e rosca eram as ofertas disponíveis, antes mesmo do almoço ser organizado.
Teresa também guarda na memória momentos de dor e esperança. “Eu fazia tanta promessa por causa do meu filho… Ele ficou em coma, e me disseram que a decisão estava nas minhas mãos. Passei a noite toda rezando. Deus me ajudou muito com a minha fé.”
Esses relatos, emocionantes e repletos de espiritualidade, ilustram como o Santuário Diocesano da Gruta de Nossa Senhora de Lourdes não é apenas um ponto turístico ou religioso: é um lugar sagrado construído com sacrifício, amor e o envolvimento de toda uma comunidade.
A cada degrau improvisado, a cada doce vendido em mesas frágeis, a cada oração feita em silêncio ou em público, o Santuário em meio à natureza exuberante em vale com mata nativa de Dom Pedro de Alcântara se tornou sinônimo de fé vivida.
No dia 25 de maio de 2025 será dia de renovar promessas, agradecer graças alcançadas e manter viva a chama da devoção à Nossa Senhora de Lourdes. Como dizem os romeiros, não se trata apenas de um evento, mas de uma caminhada coletiva de fé que já dura três quartos de século, e que, ao que tudo indica, só tende a crescer na fé e na esperança.